Tomamos conhecimento de um documento emitido
pela família proprietária da fazenda Baquit ao senhor juiz da comarca de
Jaguaruana-CE. Em linguagem bastante impositiva, dando ordens como se fossem
patrões do judiciário, os autores exigem o imediato despejo das famílias da
Ocupação Gregório Bezerra II.
Eles dizem que transitamos na fazenda e
entramos em “áreas produtivas”. Perguntamos: A que produtividade mesmo os
senhores se referem: a de calangos ou a de ferrugens, que corroem a estrutura
há tempos abandonada, como comprovam vídeos por nós apresentados?
Senhores, não estamos construindo “barracos”,
como alegam. Reiniciamos foi o processo de edificação de nossas casas, antes
interrompido pela chegada de jagunços encapuzados e armados, que nos ameaçaram
e ameaçam, os senhores sabem bem a mando de quem. Construímos casas porque aqui
é nosso lar. Os senhores enxergam a terra como fonte de lucro, a devastam,
envenenam, depois a desprezam, por isso longe de morarem nela. Para nós, ela é
fonte de vida, de dignidade. A gente cuida dela enquanto ela cuida da gente.
Lembram das frutas livres de agrotóxicos que os senhores compram nos
supermercados para alimentarem suas famílias? Somos nós quem as produzimos.
No documento, os senhores também nos acusam
de “arregimentar” pessoas. Lhes perguntamos: Existe força de atração maior do
que as cercas da opressão que os senhores nos impõem? São as suas cercas que
fazem chegar em todas as nossas reuniões famílias novatas querendo ingressar na
luta pela terra e por dignidade. De onde elas surgem? Por que elas aparecem? E
olha que não está sendo nada fácil. Os 50 jagunços enviados na madrugada do dia
26 não derramaram sangue por obra de milagre. Quem gostaria de ver seu filho se
tremendo ou desmaiando ante todo aquele terror? Ver trabalhadores de mãos
calejadas sendo postos de joelhos, humilhados, também não é nada fácil para
quem o sangue corre nas veias. Mas ainda assim chegam novas famílias todos os
dias, “arregimentadas”, como dizem os senhores, pela lei maior da necessidade.
“Arregimentadas” são outras tantas e muitas
pessoas que, ao tomarem conhecimento do que estamos passando, começam a nos
apoiar. Elas são de todo canto do Brasil. A verdade não conhece fronteiras,
senhores. Todos os dias, todos!, recebemos visitas. São comunidades,
sindicatos, estudantes, professores, padres, freiras e por aí vai. Fora as
mensagens. Temos que estar com os celulares sempre de prontidão, porque a todo
instante nossos amigos e amigas nos perguntam como estão as coisas. Sim,
senhores, muitas destas pessoas, arregimentadas pela verdade e por um
sentimento genuíno de justiça, estarão com a gente até o final, custe o que
custar.
Em outro trecho do documento os senhores
chamam nossa ocupação de “esbulho”. Leiam bem: aceitem ou não, OCUPAR É DIREITO
NOSSO! A grande propriedade que não cumpre sua função social deve ser
desapropriada para fins de Reforma Agrária. Tá na Constituição Federal! Esbulho
é quando alguém tenta se beneficiar em proveito próprio, quando invade para
enriquecer. Neste caso, o nome é “invasão” mesmo! Invasão que sofremos
continuadamente desde abril de 1500. Invasão como a dos jagunços, uma criminosa
e covarde ilegalidade para tentar burlar e impedir a garantia de nosso direito
constitucional.
Os senhores invertem as coisas. Também
pudera, nas suas cabeças o lucro está acima da vida. Mas pode ser diferente.
Tomara um dia tudo ser diferente! Entre nós e os senhores existe uma coisa que
nos impede de viver como irmãos e irmãs que somos. Essa coisa se chama
propriedade privada! Ela foi implantada em todos os lugares, e é controlada por
poucas mãos. É ela quem faz com que trabalhadores assim como nós, sem
propriedade, se submetam por um mísero ganha-pão ao papel criminoso e à chefia covarde
de jagunços profissionais, na defesa de interesses opressores. Como disse uma
de nossas crianças: “Jagunços, amanhã seu patrão fará contra vocês o que agora
fazem contra a gente”. A propriedade é a causa da cegueira que leva os senhores
a crerem que mais vale sangue inocente derramado do que tê-la em comunhão.
Mas pode ser diferente. Tomara um dia tudo
ser diferente! Da nossa parte, lutaremos até o fim para que isso aconteça.
Ocupação Gregório Bezerra II – OPA
Jaguaruana-CE, 06 de setembro de 2024
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