sexta-feira, 17 de junho de 2022

A RESERVA NO TANQUE, O COMBUSTÍVEL E OS POSTOS DE ABASTECIMENTO



 Thales Emmanuel, militante da Organização Popular – OPA.

 

            Um companheiro nosso foi atuar em outra região. Novo local, novas pessoas, novos desafios. Foi muito bem acolhido pelas comunidades e de pronto se jogou no Trabalho de Base. Quando estive lá, o encontrei eufórico. Seu olhar tinha o brilho do sol e encadeava quando se chegava mais perto. Suas palavras, ora atropeladas, ora ofegantes de agitação, refletiam seu estado de ânimo. Quatro meses desde a mudança e tudo andava maravilhosamente bem.

            Ao regressar, conversei com Jacinta Sousa, camarada de militância, e contei o que vi:

“Ele está bem. Muito empolgado. Bastantes coisas boas acontecendo por lá.”

Ela baixou a vista e silenciou reflexiva.

“O que foi? Não gostou da notícia? Que mal há na empolgação do companheiro?”

“A militância deve ser animada mesmo, mas tem que deixar uma reserva de motivação guardada, porque quando as dificuldades chegam, ela precisa ter de onde puxar a energia para enfrentar os problemas”, explicou.

Dito e feito! A euforia passou, os problemas chegaram e o tanque secou rapidamente. O companheiro não aguentou e saiu da região.

            A missão de construir o Poder Popular é como um carro numa longa estrada. O veículo se encontra totalmente imerso na rodovia, no ambiente que atravessa, assim como a militância deve estar plenamente entregue para a luta. Guardar reserva de animação não é o mesmo que se doar por fatias. Assim como no automóvel, a reserva nos serve de alerta, indica que precisamos de reabastecimento. Sem contar que toda euforia é meteórica, combustível adulterado.

            Por isso nossa provisão vem da mística, do ânimo. Nossos postos de abastecimento se encontram distribuídos infinitamente ao longo da estrada. A leitura de uma biografia, um passeio, um retiro, um abraço numa árvore, uma conversa com os mais velhos, escutar atentamente o que diz uma criança, o acalento numa amizade sincera, a desativação do zap por um período, parar na esquina para apreciar o polinizante vou de uma mamangava ameaçada de extinção, uma conversa com Deus, uma gira, um torem, um carinho de mãe, testemunhar um gesto espontâneo de amor ao próximo, uma luta, se colocar numa situação de injustiça social, o balançar de uma rede num final de tarde, uma canção, um poema, uma respiração sem pressa de acabar; enfim, fontes infindas de alimento, tão eternas quanto eterna é a estrada da vida.

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